Formação de colônias em cativeiro no centro administrado pelo Inea garantiu a preservação do sauim-de-coleira (saguinus bicolor), que serviu de referência internacional
No mês em que comemora 36 anos de fundação, o Centro de Primatologia do Rio de Janeiro, administrado pelo Instituto Estadual do Ambiente (Inea), recebe o reconhecimento pelo trabalho que garantiu a preservação de mais uma das espécies brasileiras ameaçadas de extinção: o sauim-de-coleira (saguinus bicolor), primata símbolo da cidade de Manaus.
Durante o XVI Congresso Brasileiro de Primatologia, encerrado nesta semana, na Universidade Federal do Amazonas, o pesquisador Alcides Pissinatti, com 42 anos dedicados ao CPRJ, desde a fase de implantação, recebeu uma homenagem especial da comunidade científica.
Foi na instituição, localizada no município de Guapimirim, que o professor Pissinatti iniciou o trabalho, que ganhou projeção internacional. “Em 1985, nós recebemos um desses animais, conhecidos apenas por dois pesquisadores que andaram pela Amazônia, em 1980. Eles publicaram alguma coisa e chamavam a atenção sobre o perigo que já ameaçava essa espécie, por conta do desmatamento” – lembra o pesquisador. Esse pequeno primata é encontrado somente nos municípios de Manaus, Rio Preto da Eva e Itacoatiara e está “criticamente em perigo de extinção”, segundo a petição lançada na internet para incentivar a criação de unidades de conservação na capital amazonense e engajar a sociedade na mobilização em defesa do primata.
Com os estudos sobre o sauim-de-coleira no CPRJ e a organização de grupos de trabalho, o centro deu início à formação de colônias em cativeiro, que serviu de referência no exterior. O pesquisador fica empolgado, quando conta o que aconteceu em seguida, no início dos anos 1990. “Em 5/6 anos, nós já tínhamos um plantel bom e contatamos o pessoal lá da Amazônia. Olha, nós temos um monte desses bichinhos, vocês não querem promover a soltura deles aí?” A proposta foi abraçada pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônicas e pela Universidade Federal do Estado do Amazonas, onde Pissinatti recebeu vários prêmios pelas ações “realizadas em prol da conservação do sauim-de-coleira”, como o Certificado Mérito Conservacionista - 2015.
De fato, o pesquisador do Instituto Estadual do Ambiente foi o grande responsável pelo êxito desse trabalho, que acabou ganhando a adesão de zoológicos e centros de pesquisas espalhados pelo mundo. Em 1995, Pissinatti passou a dividir com o zoólogio Andrew Baker, do Philadelphia Zoological Garden, nos Estados Unidos, todo o manejo dessa população mantida em cativeiro. Por meio de um studbook, foram registradas as linhagens genealógicas de cada indivíduo e garantida a reprodução da espécie, evitando o cruzamento entre parentes.
No CPRJ, a colônia de sauim-de-coleira ganhou impulso em 1996, com a entrada de 8 animais apreendidos pelos órgãos ambientais, o que representou um importante impulso na expansão da base da população mundial da espécie em cativeiro. Alguns animais e seus descendentes foram enviados para instituições europeias para fundar novas colônias, um esforço para manter em cativeiro uma população saudável e reintroduzir a espécie na natureza.
A trajetória desse primata, desde a sua descoberta pelo zoólogo Johann Baptist Ritter Von Spix, em 1823, é contada no livro Sauim-de-Coleira – A História de uma Espécie Ameaçada de Extinção, dos biólogos Maurício Noronha e Dayse Campista, que foi lançado durante o Congresso Brasileiro de Primatologia. O trabalho traça a evolução do processo de degradação das florestas e da biodiversidade, que coloca em risco a existência dessa e outras espécies no planeta, e acompanha o trabalho desenvolvido em cativeiro.
A criação organizada do sauim-de-coleira para fins conservacionistas é resultado de duas colônias: uma estabelecida no Centro de Primatologia do Rio de Janeiro e outra, na Universidade de Bielefeld, na Alemanha.
Hoje, são 164 animais distribuídos em 35 instituições de 11 países. A Europa se destaca, com 26 centros de pesquisas dedicados à manutenção da espécie e a mais eficiente fica no Reino Unido, a Durrel Wildlife Conservation Trust, vinculada ao Zoo de Jersey. Envolvida no trabalho com o sauim-de-coleira desde 1991, a Durrel assumiu a gestão do Programa Europeu para Espécies Ameaçadas (EEP), em 2000, quando o controle de doenças passou a melhorar e as técnicas de manejo foram aperfeiçoadas, diminuindo a mortalidade e aumentando a reprodução desse primata. No Brasil, o Zoológico de Bauru, no interior de São Paulo, se destaca na reprodução do sauim-de-coleira.